O Direito Médico e os Desafios da Responsabilidade Profissional

O artigo em estudo aborda a crescente judicialização das relações hospitalares, especialmente no que tange às alegações de erro médico. Além disso, discute a realidade institucionalizada nos Estados Unidos, destacando como a má gestão de prontuários, a ausência de políticas específicas na relação médico-paciente e a falta de um termo de consentimento devidamente preenchido aumentam os riscos jurídicos para os profissionais da saúde.

Contudo, há pontos que merecem análise crítica. A política indenizatória aplicada nos Estados Unidos não pode ser considerada referência global. O sistema jurídico norte-americano frequentemente resulta em condenações desproporcionais, desconectadas da realidade do suposto dano. Exemplos notórios incluem indenizações milionárias em casos como queimaduras por café quente e uso inadequado de medicamentos. Essas decisões fomentam a chamada “indústria do dano”, que deve ser avaliada cuidadosamente pelos tribunais internacionais para evitar excessos.

A Evolução da Responsabilização Jurídica na Medicina

Na área médica, é essencial reconhecer que estamos lidando com a vida humana, cujo valor não pode ser meramente mensurado financeiramente. Cada caso deve ser avaliado considerando sua complexidade, e o impacto das decisões judiciais precisa ser analisado com cautela.

No Brasil, observamos uma transformação na atuação dos operadores do direito, especialmente após a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (CDC). A partir da década de 1990, organizações sociais e entidades de defesa do consumidor passaram a popularizar ações contra profissionais e instituições de saúde. Até então, os pacientes raramente questionavam condutas médicas, seja por respeito aos profissionais, seja por desconhecimento técnico sobre os procedimentos aplicados.

Com o aumento da informação e os primeiros precedentes favoráveis aos pacientes no início dos anos 2000, houve um crescimento expressivo na judicialização da saúde. Inicialmente, as condenações eram baixas, mas, com o tempo, os tribunais passaram a impor penalizações mais severas, fundamentadas na necessidade de reparação e punição.

A Responsabilidade das Instituições de Saúde e o Novo Cenário Jurídico

Diante desse contexto, muitos advogados optaram por direcionar ações contra instituições de saúde e operadoras privadas, em vez de processar diretamente os profissionais. Em resposta, hospitais passaram a adotar estratégias jurídicas como a “denunciação à lide”, buscando transferir a responsabilidade para os médicos.

Apesar do crescimento da litigiosidade, poucas instituições implementaram medidas eficazes de prevenção de riscos e melhoria na gestão hospitalar. Os tribunais, por sua vez, passaram a questionar a qualidade dos documentos médicos, e a aplicação do CDC resultou em condenações baseadas na falta de informação clara e precisa.

O Conselho Federal de Medicina vem alertando sobre a necessidade de aprimoramento na elaboração de documentos médicos. Entretanto, a expansão descontrolada das universidades impactou a qualidade do ensino, dificultando a capacitação adequada dos profissionais em relação a essas exigências.

A Importância da Gestão de Riscos e a Evolução do Setor

Profissionais de saúde não possuem total previsibilidade sobre os efeitos dos tratamentos e medicamentos, e essa incerteza deveria ser amplamente discutida com os pacientes e seus familiares. A falta de comunicação entre médicos e pacientes tem sido um fator determinante no aumento das ações judiciais, levando muitos profissionais a adotarem uma postura defensiva no atendimento.

Nos últimos anos, algumas operadoras de saúde passaram a valorizar hospitais que investiram em certificações de qualidade, oferecendo remuneração diferenciada. No entanto, essa valorização ainda não é uma realidade no Sistema Único de Saúde (SUS), que carece de incentivos e investimentos para implementar mudanças estruturais.

O modelo atual se sustenta na lógica do risco calculado: enquanto o número de questionamentos for relativamente baixo em comparação aos benefícios econômicos obtidos, as instituições continuarão inertes. Essa mentalidade também é observada em setores como bancos e telecomunicações, que mensuram os custos das indenizações em relação aos lucros gerados.

Reflexões Finais

É essencial que o setor de saúde adote medidas que garantam tanto a segurança do paciente quanto a proteção dos profissionais. A ausência de uma gestão de riscos eficaz tem levado médicos a se afastarem dos pacientes, delegando informações delicadas a equipes de psicologia e assistência social.

O problema central nas relações médico-paciente não se restringe à judicialização, mas também à falta de mudanças estruturais por parte das instituições de saúde. O Poder Judiciário deve atuar com equilíbrio, evitando condenações baseadas apenas na ausência de informações claras, sem considerar a complexidade dos tratamentos médicos.

A evolução da advocacia na área da saúde requer um aprofundamento técnico, garantindo que as decisões judiciais sejam fundamentadas em critérios justos e coerentes. Para isso, é fundamental que gestores hospitalares, profissionais da saúde e operadores do direito trabalhem juntos para aprimorar a segurança jurídica e a qualidade no atendimento ao paciente.

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